RACISMO: CONHEÇA OS DANOS EMOCIONAIS E COMO TRATAR
Nas últimas semanas fomos impactados por diferentes notícias interligadas por um único tema: Racismo. Houve a morte de um jovem negro por um segurança de supermercado, no Rio de Janeiro; Um empresário foi agredido e expulso de um banco por um segurança, em Salvador; Outro supermercado foi acusado de associar uma mulher negra a vassoura, no Paraná; A MC Carol fez um desabafo sobre sua infância e vivência e a cantora Raquel Virginia presenciou um caso de racismo em um shopping de São Paulo e relatou nas redes sociais.
Todas essas situações foram amplamente divulgadas, causaram debates e indignação nas redes sociais e, algumas delas, até geraram protestos. No entanto, o que é pouco discutido é o resultado emocional do racismo estrutural e cotidiano que os negros sofrem diariamente, que pode desencadear danos emocionais, baixa autoestima e até mesmo depressão. Para falar deste assunto, conversamos com a Nancy Del Ramos, psicanalista adepta da terapia corporal bioenergética, e que também atua com a psicologia preta com foco em descolonizar o inconsciente e promover a autoestima e consciência corporal da população negra. Acompanhe:
- Nancy Del Ramos, Psicanalista
- Nancy Del Ramos, Psicanalista
SMART GIRLS: Quais são os danos do racismo para a autoestima dos negros?
Nancy Del Ramos: Sintomas de perseguição, dismorfia corporal, insatisfação generalizada consigo mesmo, dificuldade em reconhecer seus pontos fortes e capacidades, perda da vontade em realizar algo há muito planejado ou de pensar em planos futuros, busca constante por reconhecimento, retraimento social, pensamentos suicidas, entre outros… São alguns entre os principais danos causados pelo racismo que influência psicológica, emocionalmente e socialmente a vida da vítima.
SMART GIRLS: Como lidar com estes danos?
Nancy Del Ramos: A terapia é um caminho para lidar com esses sintomas. No consultório o paciente entrará em contato com esta ferida aberta e que sempre é cutucada pela sociedade. A ansiedade e a depressão no paciente negro está relacionada a repressão sofrida diariamente. A melhor forma de lidar com isso é reconhecendo a sua história, aceitando as suas origens, aceitando que existe uma desigualdade na sociedade em que ele “sobrevive”, ser negro e não existir são sinônimos e o paciente precisará saber lidar com isso da melhor forma possível.
SMART GIRLS: Como a pessoa pode identificar que está com ansiedade ou depressão?
Nancy Del Ramos: Na ansiedade os pensamentos sempre estarão ligados ao futuro. Fora os sintomas físicos como a dor ou aperto no peito, batimentos acelerados, sensação de sufocamento, suor excessivo, aumento ou perda do apetite, há também os sintomas psicológicos como, medo constante relacionado ao futuro, preocupação exagerada e irritabilidade. Já na depressão, os pensamentos estão ligados ao passado. A pessoa sentirá desânimo, insônia, falta de motivação, vontade de morrer, muitas vezes um choro inexplicável. O importante é que se a pessoa perceber essa mudança de comportamento e de humor deve procurar ajuda especializada, o diagnóstico preciso neste momento é muito importante para dar início ao tratamento.
SMART GIRLS: Como é o tratamento para pessoas nesta situação?
Nancy Del Ramos: O tratamento pode variar de profissional para profissional. Há desde tratamentos com florais, terapia corporal até medicamentos prescritos por psiquiatras. Na clínica, se um paciente negro chega com um desses sintomas, ou com um desses diagnósticos, primeiro verificar se ele possui consciência de sua cor, e de quem é ele na sociedade. Após essa primeira etapa, analiso sua história de vida, seus traumas, seus choros engolidos. Analiso também seu tipo de corpo; como esse paciente se apresenta corporalmente: ombros pra baixo, queixo erguido, peito estufado, entre outros detalhes. Após isso dou início a descolonização de seu inconsciente, discutindo crenças, indo ao fundo no que é o inconsciente coletivo e o que é seu inconsciente pessoal, numa tentativa incansável de tirá-lo do anonimato existindo para si e em si mesmo.
SMART GIRLS: O que fazer para melhorar a qualidade de vida?
Nancy Del Ramos: Melhorar a qualidade de vida da população negra brasileira vai além de ter amor próprio ou aceitação de quem se é. O negro precisa se sentir parte do todo e não aquele que come na cozinha, depois de servir o patrão. A qualidade de vida do nosso povo está totalmente ligada à consciência da população sobre o mal que o racismo representa e do medo estampado e acumulado durante anos num corpo que já nasce condenado ao ostracismo. É necessária uma conscientização geral, nossas características não precisam representar aquilo que nunca se deve ter: o feio, o que dá vergonha, o que me faz sentir inferior ao outro. A qualidade de vida do negro não depende apenas dele, mas de toda a população em reconhecer a nossa dor.
SMART GIRLS: Como cuidar da saúde mental em tempos de redes sociais. Quando somos bombardeados de comentários, posts e opiniões o tempo todo?
Nancy Del Ramos: Não adianta ficar debatendo com um racista tentando lhe ensinar que ele não deve falar do seu cabelo ou do tom da sua pele. Se sentiu ofendida? Denuncie, faça um boletim de ocorrência. O racismo é uma doença que não é exterminada com qualquer antibiótico e sim através da luta. Grupos que debatem a negritude acabam sendo terapêuticos e uma proteção à saúde mental. Existem diversos grupos desse tipo nas redes sociais que os membros acabam encontrando força entre si e maneiras de enfrentarem juntos os ataques sofridos diariamente.
Se identificou com algum item que a psicóloga descreveu? Não deixe de procurar ajuda de um especialista e grupos de apoio. Você não está só!